trinta e dois dentes de leite / 2020
nem imaginam quantos dentes compõem minha arcada que coleciono gargalhadas podres
sobre tudo que é belo.
não imaginam quanta mordaça impele meu sorriso.
nem sabem do sangue
que escorre goela a dentro -
do gosto de ferro que faz-me faminta
curiosa e urgente.
tolos
não percebem em mim qualquer respingo de dor ou vingança. meus trajes vermelhos que
guardam e mofam com o sangue
de cada um que me negou as janelas
não me interessa a verdade mesquinha
invejo as jovens, invejo o riso solto das crianças
que não se percebem dilaceradas por vir ao mundo.
tiro proveito de meus dentes afiados
para ranger nervos e carne.
rasgo
em imagem e semelhança
todos que mentem ou pensam verdades
honro a maldição primeira
a de romper o escuro-quente-úmido
para vir a este mundo
11interpretação poética do mito japonês “Kuchisake Onnal” publicado por org. Medéia (tradução para inglês) / Londres, 2020