facas, frutas y flores ou delicados objetos de tortura / 2020
dos maiores medos que guardo, além de tubarão no chuveiro: tênias - e talvez chamem-as de "solitárias". principalmente porque antes de qualquer dieta forçada, entre a intolerância a lactose e romper o cordão umbilical, sempre muito me apeteceram as carnes crua e o gosto de terra em folhas mal lavadas.
e deve ser por isso que fumo tabaco.
de vermes e hospedeiros, já guardei todos… até de mosca sair voando da cabeça. menos tênia. só que desde que precisei decorar, pra prova oral da escola, o grupo dos anelídeos e dos platelmintos que a sombra e regurgito de um bicho todo enroladinho que se acomoda quentinho e gosmento pelos intestinos e se recusa a sair pelo cu, me paira a garganta.
coisa de gente que nunca reparou muito bem onde deita e que insiste em sempre levar coisa errada à boca -antes fosse o caranguejinho que se emaranhou nesses nós , e que só com tesoura se resolve, do meu cabelo; ou o escorpião que picou pra me lembrar que não se deve nadar no escuro em piscina abandonada.
mais nova, fui vidrada em sapos -antes de gostar de tomar banho na companhia da tartaruga tigre d'água que cresceu para além do aquário e precisou morar na banheira. meus sapos de agora botam opulentos ovos, urubus continuam meus pássaros favoritos e ainda
chupo dedos enquanto zelo o falecimento de um besouro debaixo do sofá, relevo asinhas de siriri em todo o móvel da tv e controlo com rabo do olho os movimentos de uma mariposa na lâmpada da cabeceira.
por hora, meus dentes não caem mais e só enquanto por isso não falo pelos mortos, não falo pelos bichos, não falo por mim ou pela boca: sugo o sal dos cabelos, digo tudo pela garganta.
dos bichos de seda sendo criados na lua, reparo que um se acomodou na minha cama - onde também mora, debaixo do terceiro travesseiro, uma aranha. porque não sei se gosto mais de falos ou cactos. e não pretendo devolver o livro que ela me emprestou, porque gosto muito do livro e nem um pouco mais dela. na noite passada sonhei com um passarinho preto e doente que rasgava meu peito e se engalfinhava lá dentro.
acordada, me apaixonei por um cachorro-peixe.
obra audiovisual homônima selecionada em: Art Veine (Portugal), Linha Mestra ( Tocantins) e Homeostasis Lab (Brasília - DF).